Eliasch, empresário: ele já gastou US$ 10 milhões para comprar 160 mil hectares no Amazonas. Agora quer sensibilizar Ted Turner, George Sorose Luciano Benetton
POLÊMICA
Uma fortuna pela Amazônia
(Trechos de matéria publicada na Revista IstoÉ Dinheiro)
Quem é o sueco Johan Eliasch, o donoda fabricante de raquetes Head, que empreende uma cruzada para arrecadar US$ 18 bilhões e salvar a floresta
(Por Rosenildo Gomes Ferreira)
Os 5,1 milhões de quilômetros quadrados que compõem a Amazônia são responsáveis pela produção de 20% do oxigênio do planeta. A área também abriga 30% das reservas de água doce potável do mundo. Apesar de sua importância para a humanidade, a região vem sendo devastada por queimadas, pela derrubada indiscriminada de árvores e pela poluição de seus rios. Mas o milionário sueco Johan Eliasch, de 44 anos, quer mudar essa situação para melhor. Eliasch está à frente de uma verdadeira cruzada para salvar a Amazônia. Seu objetivo é levantar US$ 18 bilhões, montante que ele considera suficiente para solucionar os problemas da região. “O mundo tem de pagar ao Brasil pelo serviço de proteção da floresta”, disse Eliasch à DINHEIRO. De seu quartel-general em Londres, o empresário controla a grife de material esportivo Head, cuja receita anual soma US$ 640 milhões, e busca financiadores para a causa. A primeira reunião da série de encontros que ele pretende realizar nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia até o final do ano aconteceu há duas semanas na City, o coração financeiro da capital inglesa. Falando a executivos do setor de seguros, Eliasch lembrou que as mudanças climáticas foram as responsáveis por grandes catástrofes naturais no período 2004-2005, como o furacão Katrina (nos EUA) e o tsumani (na Ásia), que custaram indenizações recordes de US$ 83 bilhões no ano passado. “Ações focadas na Amazônia podem reduzir as alterações climáticas em um razoável espaço de tempo, melhorando nossas vidas e o planeta”, defende.
O projeto de Eliasch tem como principal vertente a criação de santuários ecológicos administrados por particulares. Em 2005, ele próprio adquiriu 160 mil hectares (equivalente a quase 200 mil campos de futebol) no Estado do Amazonas, tirando de cena uma madeireira ilegal. Gastou cerca de US$ 10 milhões. A transação teve o aval da noiva, a brasileira Ana Paula Junqueira, de 35 anos, que tentou (sem sucesso) duas vezes se eleger deputada federal: em 1994 (pelo PMDB) e em 1998 (pelo PFL). Filha de fazendeiros, ela é conselheira de Eliasch para assuntos ecológicos. O empresário diz que uma parte dos US$ 18 bilhões seria drenada para programas governamentais de saúde, educação e infra-estrutura para os 20 milhões de habitantes da região.
Se Eliasch é capaz disso tudo? Provavelmente. O empresário tem uma vasta rede de contatos na Europa que reúne empresários e políticos. Na sua base, a Inglaterra, ele é um dos principais doadores do Partido Conservador, do qual integra a comissão de finanças. Freqüenta com desenvoltura a realeza britânica. No mundo dos negócios ele é tido como um financista habilidoso, que fez fortuna recuperando empresas endividadas. Foi assim com a Head. Quando assumiu o negócio, a companhia estava à beira da falência, com prejuízo de US$ 65 milhões.
Sua proposta “verde”, contudo, é vista com desconfiança por empresários e ecologistas brasileiros. “Trata-se de uma idéia simplória, incapaz de alterar a realidade local”, critica Sérgio Amoroso, dono do Grupo Orsa, que controla o Projeto Jari de papel e celulose, situado no Amapá. Amoroso também é contra o uso de recursos privados para financiar o governo. “É preciso criar mecanismos que garantam renda permanente à população.” E é isso que falta na propriedade recém-adquirida por Eliasch. Ao desbaratar a madeireira ilegal, o dono da Head “salvou a floresta”, mas acabou com a fonte de renda de mil pessoas ligadas à madeireira. Como compensação, ele permitiu que eles coletassem castanha e açaí na área. Já Roberto Klabin, herdeiro da fábrica de papel da família e dono do resort Refúgio Ecológico Caiman, situado no Pantanal, apóia Eliasch. “A Amazônia se transformou em terra de ninguém porque o governo não assume suas responsabilidades. A compra de terras já se mostrou uma opção viável no Chile e na Argentina”, avalia. Ted Turner, fundador da CNN, o investidor George Soros e o empresário italiano Luciano Benetton são alguns dos poderosos que compraram terras e as transformaram em santuários ecológicos nos dois países. São esses milionários que Eliasch quer seduzir para a sua causa.
Brasília se mantém alheia à iniciativa. Um integrante do primeiro escalão do governo federal, que pediu para não ser identificado, argumentou que o empresário ainda não procurou formalmente as autoridades. A fonte rebateu as acusações de que o governo Lula abandonou a região, citando a criação das Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa), um projeto tocado pela ONG Fundo Brasileiro para a Biodiversidade e que deverá movimentar US$ 391 milhões até 2016. Os recursos virão do Banco Mundial, do Banco Alemão de Desenvolvimento e do governo brasileiro. A meta é implantar e gerir 50 milhões de hectares de reservas florestais, um território maior que a Espanha.
Para o biólogo Paulo Moutinho, coordenador do programa de mudanças climáticas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, atitudes isoladas têm pouca eficácia. Ele diz que o primordial seria a união de ecologistas, empresários e governo na luta antidesmatamento. Sua proposta é que se pague ao governo brasileiro pela redução na taxa de derrubada de árvores. Segundo Moutinho, a queda de apenas 10% no índice médio de destruição da Amazônia (que é de 20 mil km2 por ano) renderia ao País US$ 400 milhões. A conta baseia-se no mercado de créditos de carbono, pelo qual empresas e governos de nações ricas pagam aos países, que ainda têm vastas áreas verdes, compensações por emitir gases danosos na atmosfera. Como a Amazônia tem um estoque de 80 bilhões de toneladas de carbono, a “venda” desse ativo poderia render até US$ 160 bilhões.
A briga de Eliasch está só começando. Porém, antes de conquistar apoio mundo afora, ele precisará provar que é capaz de vencer uma floresta que já “devorou” figuras como Henry Ford e Daniel Ludwig, cujos empreendimentos de extração de borracha e celulose soçobraram diante da realidade amazônica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário