sábado, 17 de junho de 2006

A samaumeira (Ceiba pentandra), da Amazônia (Fonte da imagem)

A grande samaumeira, dos ticunas (Fonte: site de Julio Cezar Melatti)
Nas pp. 72-75 do livro Nosso Povo (Rio de Janeiro: Museu Nacional , 1985), escrito por índios ticunas, estão os episódios míticos "Como apareceu o dia" e "O coração da samaumeira", que resumo a seguir.

Como apareceu o dia. Naquele tempo era sempre noite. Os galhos da samaumeira cobriam o mundo, escurecendo tudo. Os irmãos Yoi e Ipi tentaram abrir um buraco na copa da árvore, jogando-lhe caroços de araratucupi, mas sem resultado. Chamaram o pica-pau, que tentou cortar o tronco com o bico, mas não conseguiu. Resolveram então tirar o machado da cutia. Ipi colou penas em todo o corpo e ficou deitado de boca aberta no caminho da cutia. A cutia estranhou a figura que encontrou no caminho e começou a fazer-lhe perguntas. Como Ipi não respondesse, ameaçou urinar na boca dele, cortar-lhe a língua, até que ele respondeu, dizendo que podia arrancá-la. Ela se aproximou e Ipi arrancou-lhe a paleta, a perna de trás, que era o seu machado.A cutia perseguiu Ipi mancando e gritou-lhe que, quando fizesse roça, não dissesse o nome dela, e que ela iria cobrar-lhe o roubo, furtando nas roças que fizesse. É o que a cutia faz até hoje. A cutia não pode mais plantar. Só cutia pequena ainda tem o machado.
De posse do machado, Ipi começou a cortar a árvore. Mas o corte se tornava a fechar. Yoi então tentou cortar e, onde ele batia, o corte se mantinha aberto. Quando se cansou, entregou o machado a Ipi, que continuou a cortar, mas agora o corte não se fechava mais. Apesar de o tronco estar bem fino, a árvore não caía. Olhando para cima, viram que era uma preguiça que a segurava. O quatipuru, convidado para subir e tirar a mão da perguiça do galho, foi até a metade e desceu, com medo da altura. O quatipuru pequeno aceitou subir com formigas de fogo para jogar nos olhos da preguiça. Ele subiu e conseguiu atingir os olhos da preguiça. Deu então um pulo para trás, e caiu, machucando o rabo no machado. Por isso o quatipuruzinho tem o rabo dobrado nas costas. A samaumeira caiu, e daí por diante se pôde ver o sol, o céu, as estrelas. Como recompensa, Yoi e Ipoi deram sua irmã para casar com o quatipuruzinho.
O coração da samaumeira. Depois de algum tempo Ipi foi até a árvore derrubada para ver se já tinha apodrecido. Mas ela estava viva, tinha começado a brotar de novo. Ipi ouviu batidas de coração e resolveu tirá-lo. E começou a cortar com o machado. Ipi e Yoi disputavam o machado, cada qual querendo a tarefa de tirar o coração da samaumeira. Finalmente um golpe de Yoi fez o coração pular fora. Um calango o engoliu e ele ficou parado na garganta. Ipi encostou um tição na garganta do calango e o coração pulou fora. Mas uma grande borboleta azul engoliu o coração. Ipi queimou a asa da borboleta com o mesmo tição e ela vomitou. Por isso as borboletas azuis de hoje têm manchas na asa. O coração caiu num buraco muito apertado. Yoi então mandou a cotia roer o coração pelo lado direito, trazer o caroço e plantar no terreiro. Passado algum tempo, daí nasceu a árvore de umari.
O mito da grande samaumeira e o de seu coração também estão divulgados em O Livro das Árvores (Benjamin Constant: OGPTB, 1997), um volume escrito e ilustrado pelos professores indígenas ticunas, que trata da importância das árvores na vida e cultura de seu povo. Entre as suas muitas ilustrações, há um desenho da árvore Tchaparane, que produzia terçados. Ela ficava em Cujaru, um lugar perto do rio Jacurapá, e as pessoas iam até lá e esperavam que caíssem no chão.

6 comentários:

Anônimo disse...

Olá D. Ursa.....

Adoro essas lendas...as suas historias....
Parece que fico menina ouvindo...
Rsss...
Bjs...

Anônimo disse...

Angela, eu fiz um trabalho na escola primária sobre essa árvore, acredita?

Ontem me lembrei de vc. Assisti à entrevista do jornalista Washington Novaes no programa do Roberto D'Ávila. Ele conhece profundamente a cultura indígena - é o autor d e uma bela série de reportagens sobre o Xingu que foi ao ar na extinta TV Manchete.

Matilda Penna disse...

Essas lendas são tão simples e bonitas, fascinantes mesmo.
Bom domingo para você.
Beijos, :).

Anônimo disse...

Angela , passei para deixar o meu carinho e dizer que você é para sempre , SEMPRE !

Angela Ursa disse...

Diana, a Ursa fica muito feliz de saber que você gosta das histórias indígenas :)) Beijos floridos!

Ana, pena que eu perdi essa entrevista. Então, você já escreveu sobre a samaumeira?! Que interessante! Ela é uma árvore linda! Beijos da
Ursa :))

Nanbiquara, eu também adoro essas lendas! Beijos!

Ivo, obrigada pelo carinho! Beijos floridos da Ursa :))

Lia Noronha disse...

Ursas: lendas que simbolizam as nossas origens...e transmitem uma bela mensagem ...sempre!
Beijo grande neste Domingo.